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sexta-feira, 7 de junho de 2013

Capítulo 17: A CAÇADA A TEMÍVEL PÍTON

PÍTON (Πύθων). Por Genzoman.

Hera(Ἥρα), do Olimpo, a tudo assistia. Furiosa, via o carinho de Zeus(Ζεύς) pelos filhos e por Leto(Λητώ). Agitada, andando de um lado para o outro, pensava num meio de vingar-se de sua rival.

— Já sei! — exclamou, por fim.


Caminhou pelas florestas em direção e uma enorme pedra, que beirava um profundo abismo. E lá, de pé no alto do rochedo, as vestes sacudidas pelo vento, estendeu as mãos sobre o vazio que se estendia sob seus pés.

— Piton(Πύθων), deixe a guarda dos oráculos do centro do mundo fisico de Gaia e atenda ao meu chamado! Saia das negras profundezas, rompa a terra que o cobre e venha a minha presença!

Piton (Πύθων) era filha de Gaia(Γαῖα) e após um sibilar surdo começou a subir do fundo abismo e a terra estremeceu. Um odor fétido impregnou o ar, fazendo fugir os pássaros e os pequenos animais. E a cara medonha de Piton apareceu, mergulhada na espuma fedorenta que saía de sua boca imunda, equilibrada sobre um enorme pescoço coberto de escamas, que se confundia com uma fumaça escura que ocultava o resto de seu corpo monstruoso.

Os olhos miúdos e amarelos pousaram no rosto de Hera que, impassível, continuava de braços estendidos sobre o abismo, o corpo firme com uma rocha desafiando a fúria do vento, que uivava cada vez mais alto e parecia tentar arrancar suas vestes longas e finas.

— Piton! — exclamou Hera — Piton!... Seja o executor de minha vingança! Lance sobre Leto e seus filhos toda a força abrasadora de seu ser! Destrua-os!

Piton ficou por instantes a fitá-la, procurando compreender as ordens que lhe estavam sendo dadas. Depois sacudiu a cabeça hedionda, espirrando sua baba viscosa nas roupas diáfanas de Hera, e partiu balançando o corpo enorme.

Leto, avisada pelos silfos, pegou seus filhos e fugiu da ilha, que passou a se chamar, desde então, Delos, ou seja, "ilha luminosa", em homenagem ao deus da luz e do sol. Andaram por muito tempo sem rumo, ocultando-se nas grutas e nos troncos ocos das imensas árvores. Um dia, sufocada de calor e vendo os filhos sofrerem uma sede implacável, deteve-se à beira de um poço muito fundo.

Sem conseguir alcançar a água, pediu auxílio a uns camponeses que capinavam o mato próximo. Mas eles a expulsaram com brutalidade. Como insistisse em suas súplicas, eles turvaram a água do poço, para que não pudesse ser bebida. Leto, até então assustada e submissa, encheu-se de raiva. Ergueu as mãos e bradou:

— Forças do Olimpo, potências do universo, eu convoco seu poder! A terra estremeceu e os homens recuaram, assustados. Ela continuou, apontando para eles:— Com o poder de que estou investida, neste momento, determino que permaneçam, para sempre, nesta água turva!

E imediatamente os camponeses foram transformados em rãs. Leto baixou as mãos e recuou, surpresa com a própria força, surgida da intensidade de seu ódio. Afagou os filhos, que choravam.

— Vamos, não se desesperem!... Iremos encontrar água em outro lugar.

Concentrou-se. Seu corpo vibrava, emanando uma energia até então desconhecida. Mentalmente, pediu ajuda. De algum lugar da mata, surgiram lobos negros e silenciosos, que os conduziram ao rio Xanto, onde descansaram por alguns dias. Em seguida, foram auxiliados por Poseidon, que encobriu sua fuga durante muito tempo. Uma dia, Leto encontrou Apolo(Ἀπόλλων) calado e pensativo, o olhar preso num ponto vago e indefinido. Chegou-se e sentou-se a seu lado.

— O que foi, meu filho? Alguma coisa o preocupa?

Apolo respondeu, sem desviar os olhos do ponto perdido no nada.

— Estou cansado de fugir, mãe. Vou construir um santuário e nele nos esconderemos, para sempre. Lá, ninguém nos encontrará, nem mesmo Piton.

Leto agasalhou a mão do filho entre as suas.

— Filho, e esconder-se também não é fugir?

O rapaz desprendeu os olhos do espaço e fitou a mãe.

— Um santuário é um local de proteção, o único lugar seguro para aqueles que são eternamente perseguidos, como nós.

Suas palavras foram ouvidas por Telfusa, a ninfa que reinava naquela região. Logo achou que o jovem iria construir seu santuário em suas terras e não gostou da ideia de partilhar seus domínios com ele. Resolveu afastá-lo dali. Aproximou-se com meiguice e falou:

— Apolo, sei de um excelente local para seu santuário. Vá ao monte Parnaso e entre na gruta selvagem que encontrará em suas encostas. Lá verá o mais divino dos locais, capaz de igualar-se ao Olimpo, onde poderá fazer seu santuário, que existirá para sua glória por toda a eternidade.

Vendo o filho disposto a partir em busca do tal local encantado, Leto preveniu-o:

— Meu filho, leve consigo as flechas que fabricou. Poderá precisar deles. 

Apolo beijou-a, pegou as flechas e partiu. Três dias depois, chegou às encostas do Parnaso. Procurou e encontrou a entrada de uma enorme gruta, oculta pelas sombras das espessas folhagens. Feliz, acreditando ter encontrado o divino lugar para erguer seu santuário, entrou. Logo começou a sentir um cheiro fétido, que parecia entrar por suas narinas e impregnar todo o seu corpo. Surpreso, correu os dedos pela parede interna da gruta e retirou rapidamente a mão, enojado. As paredes estavam revestidas por uma substância viscosa e avermelhada.

— Sangue — pensou, enquanto cheirava os dedos — Raios, o que será isto?

Um rugido violento mostrou-lhe a realidade. Fora enganado por Telfusa. Ali era a morada de Píton! Sentiu-o bem perto e percebeu que não podia mais fugir. Já sentia na pele o calor do hálito pútrido. Segurou uma flecha, a maior e o mais forte delas, e aguardou.

— Chegou a hora, maldita serpente —  disse Apolo, ajeitando a flecha e mirando de forma ameaçadora seu oponente — , de acertarmos as nossas contas.

De dentro da caverna partiu um urro tremendo, que fez desmoronar muitas montanhas ao redor. Logo em seguida um bafo pestilencial, um misto de fogo e de sangue, foi expelido de dentro, incendiando tudo que estivesse à sua frente. E quando Píton se jogou contra ele, Apolo lançou a flecha poderosa. Píton caiu,em seguida enrodilhou-se e esgueirou-se  para fora da cova como se fosse uma língua em chamas expelida pela goela escancarada da montanha.

Sendo perseguido por Apolo o caçador e imponente Píton, agora se via sendo caçado e diante desta situação refugia-se na cidade de Delfos, nas proximidades da fenda do Oráculo da Mãe terra de onde havia saído.

Motivado pelo fervor da vingança, Apolo atreveu-se a persegui-la ate o santuário e após subir em cima de um rochedo, mirou no abismo de sua boca infernal. A fera, contudo, desviou-se da seta, dando um salto inesperado e rolando de lado sobre a relva, que ficou toda crestada. Tão concentrado estava diante de seu exaurido rival, que não havia percebido que sua irmã lhe seguira.

— Apolo, meu irmão, cuidado! —  gritava sua irmã, que queria  ir ajudar o destemido deus.

— Não se meta nisto, minha irmã! — bradou o deus solar. —  Você é muito nova e frágil para enfrentá-la!

Apolo nem se dava conta de que tinha a mesma idade da irmã, mas naquele momento foi a única coisa que lhe ocorreu para mante-la a salvo. A serpente agora estava completamente em pé - parecia impossível, mas estava completamente ereta, como uma gigantesca palmeira, e seu ventre, originalmente claro, estava todo coberto de sangue seco e dos ossos esmagados de antigos e horrendos festins. Um silvo ensurdecedor passou sobre o rosto de Apolo, como um vento quente e mórbido que um vulcão houvesse expelido em seu rosto.

Píton entesou o seu corpo e lançou um bote quase certeiro sobre a rocha onde o deus do sol se mantinha precariamente equilibrado. Um grande dente amarelado da serpente ficou cravado sobre a rocha, como se fosse uma gigantesca espada enterrada na pedra. Dela escorria um líquido pestilencial da cor do âmbar e que exalava um odor terrivelmente nefasto.

Apolo foi cair sobre a saliência de um penedo, ainda entontecido pelo bafo mefítico de sua cruel inimiga. A serpente Píton, após relancear a cabeça em várias direções, arregalou suas grandes pupilas horizontais: uma centena de línguas fendidas saíram ao mesmo tempo de sua boca e chicotearam o ar em todas as direções. A temível Píton farejava novamente a sua presa

Mas antes que volvesse sua cabeça na fatídica direção, Apolo já estava em pé outra vez. Mirando a fera com suas mais afiadas setas.

— Serpente maldita, aqui está o seu castigo! — disse o deus, despedindo as três setas, que partiram sibilando pelo ar.

Já no caminho as poderosas setas foram duelando com as línguas serpenteantes da víbora, e uma chuva delas caiu do alto, decepadas pela velocidade das setas. Em seguida, cada qual tomando seu caminho foi buscar um alvo diferente: a primeira foi alojar-se no olho esquerdo da víbora; a segunda penetrou em seu peito, ausente de escamas, enterrando-se em seu coração; e finalmente a terceira entrou-lhe pela boca adentro, tirando-lhe o hausto da vida. Como uma palmeira que tomba, a serpente Píton caiu, provocando um grande estrondo, que fez tremer a Terra durante oito dias. O veneno da serpente jorrou por mil feridas, restando assim vencida a temível besta, espalhando pelo chão um sangue negro e empestado. E Apolo colocou o pé sobre ele,dizendo:

— Apodreça onde está, e nunca mais volte a me perseguir!

Apolo voltou, vitorioso, e puniu a maldade de Telfusa esmagando-a contra um rochedo, com uma pedra. Vendo que sua mãe se aproximava, ansiosa por abraça-lo, deteve-a com um gesto.

— Mãe, não se aproxime de mim! Estou imundo, contaminado pelo sangue de Piton, que destruí. Vou partir novamente, desta vez para me purificar.

Apolo exilou-se na Tessália por muito tempo. Para purificar-se do contato com o mostro Piton, procurou viver em harmonia intensa com a natureza e com os animais. Com o tempo, aprendeu a linguagem deles e, por onde andava, era sempre seguido pelo bichos da mata, que se agasalhavam na suave vibração de sua aura. 

Para ocupar seu tempo, trabalhou como pastor, ocultando de todos sua origem divina. E meditava. Em seus período de interiorização, procurava criar mentalmente a imagem de seu santuário. Mas ainda não se sentia suficientemente puro para construí-lo. O sangue de Piton ainda ardia em sua pele.

Um dia foi encontrado por Eros, que por ali passava carregando sua aljava repleta de flechas. Eros, sempre divertido e brincalhão, deteve-se ante a aparente tristeza de Apolo.

— Ora, — pensou Eros — não é aquele o filho de Zeus e Leto? E por que está tão triste assim? Deve ser a solidão... Talvez falte um pouco de movimento em sua vida. Acho que vou providenciar isto, ao mesmo tempo que me divirto!...

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