ARES(Άρης). Por Sayara-S. |
Agraulos(Άγραυλος) tinha ciúmes de Herse(Έρση), pois sabia que ela recebera o amor de Hermes(Ἑρμής), por quem nutria secreta paixão. Herse, Pândrose(Πάνδροσος) e Agraulos moravam na Acrópole, a serviço de Athena(Ἀθάνα). Sua casa tinha três aposentos, e no do meio morava Herse.
De vez em quando, Hermes, o deus-mensageiro, vinha espiar as três enquanto carregavam na cabeça as cestas sagradas de Athena numa procissão solene e acabou se apaixonando por Herse, a mais jovem.
Porém, antes do por-do-Sol e do regresso da deusa Athena, retornando do festival, Hermes subornou Agraulos para lhe dar acesso a Herse, por quem estava violentamente apaixonado.
Agraulos aceitou o ouro de Hermes, mas nada fez para merecê-lo, pois Athena a havia feito sentir ciúmes da boa fortuna de Herse; assim, Hermes sentiu-se injuriado e quis com um toque do Caduceu mágico transformá-la numa imagem de pedra, mas as Moiras (Μοίρες) já tinham preparado para ela um trágico fim, e Hermes deixou-a em paz.
Herse deu a seu divino amante, segundo diziam os atenienses, um formoso filho, chamado Céfalos(Κέφαλος), e outro chamado Cérix(Κήρυξ), o primeiro antepassado da família dos Kerukes, os “arautos” dos Mistérios de Elêusis.
E mesmo depois da morte de Herse, Agraulos continuava a moer-se de ciúmes. Imaginava a irmã nos braços de Hermes e não se conformava em jamais ter conseguido a atenção do deus mensageiro.
Com o tempo, seus ciúmes aumentaram tanto que Hermes começou a sentir, de longe, as agulhadas do despeito de Agraulos. Um dia perdeu a paciência, voou até Atenas em suas sandálias de ouro e transformou a moça numa estátua de pedra.
Agraulos, ao morrer, deixou órfã a filha, que tivera do deus Ares(Ἄρης). Álcipe(Αλκίππη), viveu na casa de seu avô Cécrope até Crânaos ocupar o trono de Cecrópia.
Ares sempre foi um pai protetor de seus filhos e ele era o único deus a agir desta maneira. É geralmente a atos de violência que se liga o nome de Ares.
Era Alcipe muito jovem ainda quando foi percebida por Halirrhothius(Αλιρρόθιος), filho de Poseidon e da ninfa Êurite. Halirrhothius passou a vigiar os passos de Alcipe, fascinado por sua beleza e sua juventude. Um dia, aproveitando um momento de fragilidade da virgem Álcipe, resolveu violentá-la, já que a moça não se decidia em aceitá-lo.
Vendo que a menina se afastava para o meio da floresta, correndo atrás de uma borboleta, impiedosamente, usou a força para satisfazer seus desejos. Atacou-a, cobriu-lhe a boca para que não gritasse e violentou-a.
O crime acontecera próximo à fonte de Asclépio, em Atenas. Ares descansava de um longo combate, refestelando-se com o som das águas cristalinas, quando ouviu gritos desesperados. O deus da guerra depara-se com uma jovem correndo desesperada sobre a relva. Suas vestes estão em pedaços. O que causou a fúria do deus da guerra.
Halirrhothius, ofegante de desejo, persegue a jovem, na tentativa insana de possuí-la, não se apercebendo da presença da divindade olímpica. Furioso, Ares investe contra o jovem, em um momento de grande violência, dilacerando o seu corpo, fazendo o seu sangue jorrar nas águas límpidas da fonte.
A jovem assiste com horror àquela cena de violência e impacto. Está muda, sem fala, quando o deus oferece-lhe a mão e a leva do local do homicídio. A jovem era Alcipe, a sua filha. Não poderia deixar que lhe ultrajasse o corpo.
Ao saber do crime, Poseidon(Ποσειδῶν), o senhor dos mares, fica enfurecido. Halirrhothius era o seu filho. Movido pela cólera, Poseidon decide uma vingança pessoal, humilhar o deus da guerra.
A princípio pensa em eliminar a prole de Ares. Não lhe poderia matar, visto que era imortal. Pensando com a razão, exigiria a justiça dos outros deuses. Poseidon foi até o Olimpo e exigiu que o irmão Zeus(Ζεύς), convocasse todas as divindades e levasse Ares a um julgamento.
Os doze grandes deuses, que se reuniram numa colina, junto à qual o homicídio fora cometido, situada em frente à Acrópole de Atenas. Ares sofre a humilhação de um julgamento. As divindades escutam os argumentos de Poseidon e os do réu. Ares fala com eloquência sobre o que se passara diante de todos e de sua filha cabisbaixa:
— Próximo de uma fonte, em Atenas, eu passeava, despreocupado, usufruindo a calma beleza da paisagem. De repente, gritos de pavor feriram-me os ouvidos e detive a caminhada. Meus olhos rapidamente procuraram em redor, e deparei-me com uma cena de violência. Correndo sobre a relva, uma jovem fugia de um rapaz que tentava agarrá-la. Tinha as vestes parcialmente rasgadas. O belo rosto estampava terror. As mãos ergueram-se, trêmulas, tentando defender a pureza ameaçada. Seus pedidos de socorro silenciaram o canto dos pássaros. Então interferi. Rápido e preciso, segurei a moça, e defendi-a com meu corpo. Ao ver-me, o perseguidor parou, perplexo. Não sabia o que fazer, e fugiu. Um dia, o rapaz, enviado por seu pai a cortar as oliveiras sagradas da deusa Atena, ao dar um golpe com seu machado, feriu-se a si mesmo, e então morreu. O sangue escorreu como um pequeno rio. Mas a água da fonte continua a jorrar, mansamente, como se nada houvesse acontecido. Os olhos daquela moça choravam com tanta violência. Ela sequer esquece a cena terrível. Foi assim que aconteceu.
Os Imortais que se faziam presentes ouviam atentamente suas palavras. Pela primeira vez um homicídio estava sendo julgado por todas as divindades do Olimpo.
Poseidon mal podia conter sua irritação:
— Presunçoso maldito, todos aqui sabem que a moça era Álcipe, sua filha, e o jovem que ficara morto perto da fonte, enfeiando a paisagem, era Halirrhothius, meu filho. Relatas uma história mentirosa.
— O rapaz ainda estava ofegante de desejo, mas também cheio de medo. À sua frente, então, crispado de ódio, lancei um grito de guerra e o ataquei, como faria um pai por sua filha violentada. Mas o que mudará este fato? Agi em legítima defesa, como sempre ocorre a qualquer dos deuses que tem um filho seu ultrajado.
Tivesse o deus dos mares se vingado pessoalmente da afronta sofrida, as coisas certamente estariam resolvidas. Mas, ao invés, resolvera conduzir-se de modo racional, e convocara as divindades para julgar o crime cometido pelo senhor da guerra.
Após ouvir os dois lados, os olímpicos confabulam Passaram-se momentos angustiantes. Até que surgiu o veredicto final:
— Ares é inocente. Afinal, não há testemunhas que comprovem o contrário, que tenham presenciado algum alto indigno.
Findo o julgamento, os imortais retiram-se, aos poucos, deixando os ecos das suas palavras diluídas sobre a colina. Foi a primeira sentença pronunciada contra o autor de um delito de sangue. O local, onde Ares fora julgado e inocentado, passou a chamar-se Colina de Ares, ou em grego, Areópago, seu mais famoso santuário. Ali, na colina de Atenas onde restam apenas os ecos das palavras, serviria de cenário para vários julgamentos dos atenienses e de mortais vindos de outros lugares.
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