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terça-feira, 3 de setembro de 2024

CAPÍULO 87: OS GÊMEOS DANAO E EGIPTO

DÂNAO(Δαναός) E EGITO(Αίγυπτος)
                                                            
 
Adrasto(Δαναός)  descendia de Belo, tio de Cadmo(Κάδμος) , que se casara com Anquínoe, filha do rio Nilo. Anquínoe deu a Belo(Βήλος) os gêmeos Egito e Dânao, que cresceram em meio a um ódio mútuo e inexplicável. 

Por mais que fizessem, seus pais jamais conseguiram que os meninos se tolerassem um ao outro e sua maior preocupação era que um dia viessem a se destruir. Dânao teve cinqüenta filhas, com várias mulheres e, curiosamente, Egito teve cinqüenta filhos, também com inúmeras mães. 

Com medo que o ódio de Egito pudesse prejudicar suas indefesas filhas, Dânao fugiu com elas para a Argólida, onde reinava Gelanor. Ao saber da chegada de Dânao com aquele exército de filhas, Gelanor(Γελάνωρ) o chamou imediatamente à sua presença. 

Nunca ninguém soube sobre o que conversaram, durante as longas horas em que ficaram fechados a sós, na sala de audiências. Enquanto isso, o povo reuniu-se em volta do castelo, curioso com a chegada daquele misterioso viajante, que viera trazendo consigo cinqüenta belas moças, que mais se pareciam com as ninfas dos rios e das florestas. Entre sussuros e cochichos, procuravam saciar sua curiosidade.

— Quem será ele?—  Indagou um.

— De onde veio?—   Questionou o outro;

— Porque trouxe consigo as ninfas das florestas? —  Admirou-se um terceiro — Acho que é um deus...
Logo a multidão comecou os seus questionamentos entre si. 

— Um deles? Qual deles? Talvez o filho de um deus. Quem sabe de Apolo(Ἀπόλλων)? 

— O filho de Apolo chegou, trazendo as ninfas das florestas! 

— Estará ele querendo para si o trono da Argólida? 

— Nosso futuro rei é filho de Apolo! 

— Que sinal Apolo nos dará, para sabermos se realmente enviou seu filho para nos governar? 

Preocupada com o forasteiro, a multidão não viu que um lobo invadiu a cidade e atacou um rebanho, matando o touro. Vendo nisso o sinal pedido a Apolo, o povo destronou Gelanor e entregou a coroa a Dânao. Quando o chamavam de filho de Apolo, Dânao apenas sorria. 

— Afinal de contas — disse ele às filhas, em tom maroto — para que desapontar o povo que me escolheu com tanto calor? 

Dânao fundou a cidade de Argos, onde fez um santuário para Apolo Lício, ou seja, Apolo, deus-lobo. 

Os cinqüentas filhos de Egito, com saudades das primas com quem conviviam pacificamente, apesar do ódio dos pais, logo se mostraram aflitos com a partida das moças. Reuniram-se todos em volta do pai.

— Pai — disse um deles — crescemos ao lado de nossas primas e agora, que elas se foram, sentimos uma falta imensa e uma dor insuportável. 

Egito ergueu as sobrancelhas. 

— Ora essa! Que culpa tenho eu se o idiota do meu irmão resolveu levá-las embora? Também lastimo, pois apesar de filhas de Dânao, são moças encantadoras e dignas do meu afeto. 

— Pai, — pediu outro filho — gostaríamos que procurasse Dânao para um acordo de paz. 

— Paz! — explodiu Egito — Como poderá haver paz entre Dânao e eu? 

— Calma, pai? Não acha que chegou a hora de por um fim a essa desavença ridícula? Pense um pouco em nós, por favor! 

— Pai, escute nossa sugestão. Envie um mensageiro à Argólida com uma proposta de paz, pedindo, em seu nome, a mão de suas sobrinhas em casamento para seus filhos. Se Dânao aceitar, haverá uma grande oportunidade de iniciarem um relacionamento amistoso e merecido, depois de tantos anos de brigas. Se ele não aceitar, prometemos nunca mais insistir num pedido desta natureza. 

Egito pensou muito, antes de resolver. Mas acabou cedendo à pressão dos cinqüenta filhos e enviou um mensageiro à cidade de Argos. 

Dânao ouviu a proposta do mensageiro com atenção. Depois pediu-lhe que esperasse, enquanto consultava as filhas. Fechou-se com elas num dos salões do castelo e falou: 

— Minhas filhas, todas vocês sabem que fugi para a Argólida com medo que seu tio, Egito, pudesse prejudicá-las de alguma maneira, aproveitando-se de sua fraqueza feminina. O ódio mútuo que nutrimos, desde crianças, um pelo outro, não pode ter desaparecido assim, sem mais nem menos. Egito enviou um mensageiro com uma proposta de paz e um pedido de casamento, para unir nossas famílias. Não acredito nesta proposta de paz. Egito sabe que ocupo o trono da Argólida e, na certa, quer ocupar o meu lugar. Pretendo acabar com isto de uma vez. Ele mesmo preparou seu próprio destino e o de seus cinqüenta filhos. Vou aceitar o pedido de casamento e ceder vocês a seus primos. 

Um rumor de espanto encheu o salão. Dânao estendeu as mãos, pedindo silêncio. 

— Ouçam bem o que vou dizer agora: Todas receberão um punhal e, na noite de núpcias, antes que seus esposos as toquem, irão assassiná-los sem misericórdia. 

Outro zum-zum pelo ar, misturado aos olhares atônitos das moças. Uma delas se adiantou. 

— Pai, — disse ela — por que devemos matar nossos primos, que nunca nos fizeram nenhum mal? Eles não têm culpa do ódio que você e nosso tio nutrem um pelo outro, desde crianças. 

O rosto de Dânao se tingiu de púrpura. 

— Como se atreve a contestar uma ordem direta de seu pai, Hipermnestra(Υπερμνήστρα)? As filhas devem apenas obedecer. Aos pais cabem as decisões! 

— Mas, pai, isto é um absurdo! Não liquidaremos nossos primos! Não podemos fazer isso! 

— Cale-se Hipermnestra! Vocês vão fazer o que mandei e não admito contestações! Espero que tenham compreendido bem minhas instruções. Vocês eliminarão seus esposos, antes que eles as toquem. não quero que nenhuma das minhas filhas chegue a pertencer a um filho de Egito! 

E, pouco depois, o mensageiro retornava com as boas novas: Dânao aceitara o acordo de paz e concedia a mão de suas cinqüenta filhas aos cinqüenta filhos de Egito. ...